Perdi
a minha chave? Durante esse primeiro semestre faço essa indagação, com alguma “estranhez”
meu jardim secreto tornou-se inacessível. Então o mundo externo que tantas
vezes é tão fatigante cresce em mim e aspira meu pequeno universo.
Em
criança recordo-me do deslumbramento diante do livro grande com bordas douradas
era a obra completa do Monteiro Lobato, carregava o bendito para todos os
lados. O Sitio do Picapau Amarelo foi meu primeiro reino encantado, foi com ele
que fui a Grécia e descobri que as estatuas tinham cor, assisti ao por do sol
de trombeta e aprendi que todo o texto quando não sabemos mesmo como começar é
só encher de seis grandes interrogações ( hoje compreendo que é a interrogação
será sempre constante). Emilia, boneca meio gente, cedo compreendi que ela era
o porta-voz do escritor oculto.
Depois
do Sitio do Picapau Amarelo vieram outros reinos: O jardim secreto, País das
Maravilhas, Terra do Nunca, Pais dos espelhos, As casas de Laura Ingalls, o mundo de Sofia, a dor real de Annie
Frankie e outros que minha memória desbotou seus tons.
Revisitei Alice no País das Maravilhas a
história é a mesma, mas os nuances são diferentes quando o olho amadurece é
impossível não se admirar com a existência de um cogumelo que faz crescer e
diminuir. Hoje percebo que na vida adulta as pessoas escolhem seus “cogumelos”
vestindo seus tamanhos de pequenez ou grandeza e compreendo a extrema
importância de se ter a medida exata. E o tic-tac do relógio do coelho a
lembrar: estou atrasado... estou atrasado é sempre essa corrida maluca que nos
propomos para dar conta das inúmeras exigências ( pagar contas, ganhar o
dinheiro, ser bonito, inteligente, líder, estudar, trabalhar são tantos
verbos).
Quando
relembro a capacidade de admirar a fantasia não é em tom de escapismo é a
certeza de que destituída da chave que abre o jardim secreto existo pela
metade. E à medida que as exigências reais crescem mais a chave emperra na
fechadura e o temor de que o reflexo do espelho seja a caricatura da mulher “ modus operandi” que nada admira, nada
sente, nada vê, nada transforma, nada imagina é muda.
Já
velha descobri o mundo de Nárnia meu atenuante no período “modus operandi” e com sintoma de mudez poética-patética. Impressiona
a riqueza da descrição das terras narnianas e toda a alegoria utilizada pelo
autor para falar de coisas de coisas tão complexas como o poder, tirania,
antagonismo entre o mal e o bem, as trapaças em busca de poder (muitas vezes
tomamos como o detentor do poder um burro travestido de pele de leão)[1].
Lewis em um texto final chamado Três maneiras de escrever para crianças
discorre sobre os livros de fantasia e diz que ao final muitas vezes eles propiciam
ao leitor a ampliação e compreensão dos sentimentos humanos para ele a fantasia
perigosa é aquela superficialmente realista quando as histórias passam a tratar
dos anseios puramente materiais ( enredos com
beldades, dinheiro etc.) estreitando assim a formação do caráter
infantil.
Recuperar
a chave perdida do jardim secreto será a missão particular porque é preciso
adquirir novos sentidos sobre nossa humana condição.